segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

A parte do tráfico de animais silvestres que poucos conhecem

O tráfico da fauna silvestre brasileira normalmente é acompanhado pela imprensa e a população até o ponto da apreensão dos animais pelos órgãos de fiscalização. Divulga-se um pouco do problema da exploração das comunidades que vivem em regiões pobres do país, com destaque para as localizadas na caatinga, no cerrado e na amazônia; bastante sobre as operações de repressão que resultam nas apreensões e quase nada sobre o que acontece após essa última etapa.

O site Olhar Direto, de Mato Grosso, veiculou uma matéria sobre a soltura de 17 araras que foram, há dois anos, apreendidas em São Paulo. Na matéria Araras apreendidas do tráfico de animais são devolvidas à natureza, do repórter Lucas Bólico, apresenta-se um pouco da dimensão desse problema:

“O veterinário e chefe do Núcleo de Fauna e Pesca do Ibama, Cesar Soares, explica que estas aves foram apreendidas no estado de São Paulo e submetidas a exames e processos de reabilitação para poderem regressar à natureza. O custo para a recuperação de cada animal é alto. “Só para os exames, são gastos em média R$ 700,00 por animal, isso sem falar em alimentação e etc.”, conta.”

Momento da soltura das araras
Foto: Lucas Bólico/Olhar Direto

A falta de estrutura, tanto da União quanto nos Estados para o recebimento, recuperação e posterior envio para soltura (quando é possível) de animais vítimas do tráfico em seu hábitat está escancarada. A maioria dos centros que recebem os espécimes transforma-se, com o passar do tempo, depósitos de animais.

Enquanto não existirem políticas públicas realmente consistentes que abordem o problema do tráfico de animais com seriedade, principalmente na abordagem do período pós-apreensão, continuaremos a ver apenas 17 araras retornando para a natureza. Apesar de o fato noticiado pelo Olhar Direto ser maravilhoso, quantos milhares de animais silvestres (principalmente pássaros) são apreendidos e ficam amontoados em centros sem infraestrutura ou entregues para criadouros conservacionistas que, muitas vezes, estão também envolvidos na rede do tráfico?

Alguém pode me dizer quantos animais são devolvidos para a natureza após serem apreendidos? Garanto ser um percentual mínimo.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Tigres: muito perto da extinção

Em “Para não dizer que acontece somente longe de casa...”, citei o tráfico de partes de tigres, principalmente para a China e Rússia. Nesse texto, aproximei as realidades das matanças de animais silvestres na África e no Brasil que, apesar de contextos diferentes, têm nos grandes felinos preciosas vítimas. Como li e guardei algumas matérias sobre o assunto, resolvi apresentar um pouco das informações que chegaram à imprensa brasileira.

Atualmente, partes de tigres, como peles e garras, são bastante valiosas na China – de acordo com matérias veiculadas nos suplementos do The New York Times publicados em 22 de fevereiro e 22 de março de 2010 na Folha de S. Paulo. Cada pele chega a custar US$ 20 mil e uma pata US$ 1.000. O comércio ilegal e lucrativo tem causado a queda da população mundial desses animais, estimada em 1.400 animais (metade da registrada há 10 anos e uma pequena fração dos 100 mil que viviam na Ásia no início do século 20).

Foto: site www.imagensgratis.com.br

Em recente matéria publicada pela revista Terra da Gente (“Imperador Ameaçado”), edição de novembro de 2010, a situação dos tigres é um pouco melhor: seriam 3.200 animais livres na natureza (havendo apenas mil fêmeas prontas para reprodução) – dados da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, em inglês).

Além da óbvia redução do hábitat promovida pela ocupação humana, a pressão sobre as seis subespécies não extintas (outras três já não existem mais – tigre-de-bali, tigre-de-java e tigre-do-cáspio ou tigre-presa) é muito motivada pela seguinte anatomia da medicina tradicional e da evocação por proteção sobrenatural:

- bigodes: em Sumatra, acredita-se que trazem boa sorte e protegem contra maldições;
- caninos: usados em joias para atrair sorte e proteção;
- cauda: usada para tratar doenças de pele na China;
- olhos: usados para tratar epilepsia;
- ossos: usados na medicina chinesa;
- osso da pata dianteira direita: em Sumatra, é usado para tratar dores de cabeça;
- patas: adornadas com ouro para atrair sorte e proteção (Sumatra);
- pênis: acredita-se que promova virilidade e vitalidade, sendo muitas vezes imerso em tônicos ou em álcool (China);
- peles: pequenos pedaços são usados para a proteção contra magia negra e xamãs podem usá-las para fazer feitiços (Sumatra). No Tibete, a pele serve para fazer roupas cerimoniais.

Para quem deseja saber mais sobre a questão do tráfico de animais na Ásia, recomendo a matéria "O tráfico da vida", publicada na edição de janeiro de 2010 da National Geographic Brasil.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Para não dizer que acontece somente longe de casa...

Não tinha como deixar de escrever sobre o que li hoje em alguns sites que noticiaram a apreensão, no Gabão, de cabeças e mãos de chimpanzés e um gorila, além de peles de leopardos, leão, couros de cobra e rabos de elefantes. Resultado de uma operação das autoridades daquele país africano, o "material" apreendido seria consequência do hábito de comunidades em se alimentarem de carne de animais silvestres e de utilizarem partes dos espécimes (como as cabeças e as mãos) em rituais de magia, como amuletos de boa sorte ou na medician tradicional.



Em parte, as informações procedem. Mas creio que as peles de leopardos devam ter outro fim - não abordado nas matérias que li. Arrisco eu que possam ser utilizadas como ornamentos, como aconttece com os tigres asiáticos.

Mas para não dizer que esse tipo de aberração acontece somente longe de casa, em países da Ásia ou África, vamos relembrar alguns fatos. Em julho de 2010, a Polícia Federal e o Ibama realizaram a Operação Jaguar, que desarticulou uma quadrilha que promovia caçadas no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná, promovendo a morte de grandes felinos, como onças pintadas, pardas e pretas. Pior do que a matança justificada para alimentação ou ritual religioso é a matança para entretenimento (safáris)- como o caso registrado no Brasil.

Peles apreendidas na Operação Jaguar
Foto: Divulgação Polícia Federal

Leia os detalhes do caso africano na matéria de O Estado de S. Paulo e da BBC.
Relembre da Operação Jaguar.

Aproveito a oportunidade para apresentar alguns números que podem ajudar a contextualizar um pouco o tráfico de animais silvestres (incluindo seus subprodutos, como peles e garras):

- Terceira atividade ilegal mais rentável do mundo (atrás do tráfico de drogas e do comércio ilegal de armas): entre 10 e 20 bilhões de dólares por ano, sendo o Brasil responsável por uma fatia que varia de 5% a 15% do total;
- Segunda causa da perda de biodiversidade (atrás da perda de habitat);
- Dependendo da fonte consultada, o número de animais silvestres retirados da natureza no Brasil, por ano, é 12 milhões ou 38 milhões;
- Entre 60% e 70% do comércio ilegal de animais silvestres no Brasil é voltado para abastecer o mercado interno: estima-se que de dois a quatro milhões de animais silvestres vivam em cativeiros particulares;
- Estima-se que 95% do comércio de animais silvestres no Brasil seja ilegal;
- Há pesquisas que apontam haver 60 milhões de brasileiros criando espécimes da fauna nativa em suas residências.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Alguém pode, por favor, me explicar como um tuiuiú foi parar no sertão de Pernambuco?

Fui surpreendido esta semana com a notícia da apreensão de um tuiuiú - ave-símbolo do Pantanal - em plena região de caatinga. O animal,é lógico, virou celebridade no município de Parnamirim, onde a população, curiosa, fez fila para vê-lo e tirar fotos. Afinal, o hábitat dessa espécie está a cerca de três mil quilômetos dali.

Ave foi encontrada a três mil quilômetros de seu hábitat
Foto: Arquivo soldado Felipe André

O mistério do aparecimento do tuiuiú no sertão de Pernambuco é lógico que me chamou a atenção. Como não tenho a menor competência técnica para analisar se, por mais absurda que seja, existe a possibilidade desse animal ter saído por vontade própria do úmido Pantanal para a árida caatinga, lógico que optei por acreditar que alguém o levou até Parnamirim. Após essa rápida conclusão, fiquei intrigado para saber se a ave estava sendo transportada como encomenda para alguém ou se essa pessoa teve a infeliz ideia de capturar o espécime (que pela foto dá para perceber não ser nada pequeno) para mantê-la em cativeiro.

De qualquer forma, nunca tiva visto tiuiuiú ser vítima do tráfico de animais silvestres. Alguém pode me esclarecer se há comércio para esse tipo de ave?

Separei duas notícias sobre a apreensão do tuiuiú:

Quer saber mais sobre tuiuiú, clique aqui

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Nosso primeiro contato...

Sempre que leio, ouço ou assisto, aqui por São Paulo, notas e matérias sobre assuntos relacionados à fauna, paro alguns instantes para uma breve reflexão. Tenho cá minhas impressões e conclusões, que acabo por guardá-las comigo na maioria das vezes, sem compartilhá-las com um tanto de gente que sei ter interesse em trocar informações e opiniões sobre o assunto.

Resolvi então expor algumas dessas minhas reflexões, muitas dúvidas e as informações que me chamam a atenção. Tenho uma atenção toda especial com o problema do tráfico de animais silvestres, que vou abordar constantemente.

Já deixo aqui uma pergunta: você já reparou que, depois das apreensões de animais realizadas, pouco se informa ou se explica sobre o destino dado aos espécimes? A imprensa, em geral, se contenta em publicar o envio das vítimas do tráfico para os Centros de Triagem de Animais Silvestres do Ibama (CETAS) ou para criadouros particulares autorizados na recepção. E sempre nas últimas linhas de cada matéria.

Apreensão de aves no Pará
Foto: Christina Whiteman/Ibama

Já havia reparado nisso há algum tempo, mas voltei a refletir sobre o assunto após ler uma matéria da edição do dia 14 do Diário do Pará. Como a apreensão foi feita, aparentemente, em área próxima aos locais de captura, a soltura dos animais é um pouco mais fácil. Agora imagine se essas aves tivessem chegado a São Paulo?